terça-feira, 14 de outubro de 2014

Professor de Viana supera desafios e publica dois livros

Texto: Júlio Palassi / Foto: Luana Correa14/10/2014 - 12:45 h

A história de Osiel Basílio, 31 anos, sexto filho de uma família de oito irmãos poderia ser como tantas outras de alguém que nasceu pobre e foi criado na periferia da Grande Vitória: voltada para a violência, o tráfico, a morte. Mas ele, com o apoio dos pais e irmãos, quis escrevê-la diferente e usou a caneta e o papel para traçar o seu caminho, e hoje, depois de vender frutas no sinal de trânsito e doces em ônibus na adolescência, Osiel conquistou o diploma universitário e foi além, virou escritor.
Em 2006 publicou um livro no segmento religioso, intitulado ‘Chega de Ritual’, mas sua maior produção é de obras poéticas, contos, crônicas e textos de autoajuda, e aí surgiu a ideia do segundo livro: ‘No porão da alma’, lançado em 2013. “Este livro reúne poemas que falam ao nosso interior, que bolem com nossos sentimentos e o nosso pensar. A ideia é mexer com a alma do sujeito. Que o leitor seja mexido para uma reflexão moral, uma lembrança, uma questão ética”, explicou.
‘No porão da alma’ apresenta 110 dos mais de 1.500 poemas que Osiel escreveu desde a adolescência. Foram publicados mil exemplares do livro, que está à venda na livraria Logos ou com o autor e custa R$ 25,00. É uma produção independente publicada com incentivo da Lei Bananeira, em Cariacica, município onde mora com a esposa.  
Formado em Letras Português/Inglês numa faculdade particular de Vitória com o apoio de uma bolsa que custeou 100% a graduação, Osiel atua em duas escolas da rede municipal de Viana. Pela manhã é professor de inglês na escola Francisco de Assis Pereira, em Canaã, e à tarde trabalha na escola Alvimar Silva, em Ipanema, na mesma disciplina. “Há um ano minha profissão é professor. Ser professor é uma realização, porque desde menino eu queria ser escritor e professor e na adolescência dava aula de reforço no bairro e, na igreja, nas atividades comunitárias, ensinava crianças”, contou.
Ele também estudou Teologia e Psicanálise com descontos de 50% e 70%, respectivamente, na mensalidade. Curioso, na adolescência Osiel conseguiu ingressar num projeto da Vale do Rio Doce para aprender tocar violino. “Corri atrás dessa oportunidade e chorei até conseguir a vaga. Na época, apenas estudantes de Vitória podiam integrar o projeto”, comentou o escritor, que, em outra oportunidade estudou canto lírico e canto popular.
Flexal
IMG_6292.jpgOsiel nasceu e viveu até dois anos atrás em um bairro da periferia de Cariacica, chamado Flexal, um lugar conhecido na mídia local por seu alto índice de criminalidade. Esse fato, o fez enfrentar preconceito social em vários momentos, inclusive ao escrever os livros. “Esse problema hoje está superado, mas era constrangedor ver a reação das pessoas quando ia fazer cadastro para emprego ou em lojas e dizia que morava em Flexal. Na faculdade, também percebia o preconceito velado dos colegas. Já chorei por isso”, revelou. 
Superando este e outros desafios, os poemas de Osiel expressam crítica política, reflexões sobre coisas do cotidiano, histórias de lugares, e muitos outros temas. “Em tempos em que a literatura se afastou tanto do mundo da experiência, é bom ver autores que trazem o palpável da existência de volta ao texto. Pois o caminho é de mão dupla, nesses casos: quando a literatura vem ao mundo, o mundo vai à literatura”, comentou o professor Wolmyr Aimberê Alcântara, mestre em Estudos Literários pela Universidade Federal do Espirito Santo (Ufes).
Poemas engavetados
O amor de Osiel pelas letras começou cedo. “Aos cinco anos já sabia ler e escrever e aos sete reunia a família e os amigos para me ouvirem. Depois, na adolescência, comecei a escrever poemas e tenho mais de 1.500 na gaveta”. A inspiração para escrever vem de todos os lugares e situações, de acordo com o autor. “A gente vê coisa que a maioria não enxerga. O mundo é minha inspiração”, disse.
Segundo Osiel, atualmente as pessoas leem muito, mais do que antes de toda a tecnologia disponível no momento para isso. “Temos espaço nas redes sociais e autores desconhecidos têm oportunidade de postar seus trabalhos em blogs, por exemplo, e serem bem acessados e lidos. A poesia tem muito espaço hoje, mas é um espaço limitado para o livro impresso, pois as pessoas vão pouco às livrarias fazer suas compras e aquelas que compram pela internet ainda somam um número pequeno”, comentou.
E Osiel quer chegar mais longe. Atualmente está fazendo pós-graduação na área da Educação, além disso, quer expandir as palestras que ministra sobre a arte de ser poeta, de criar poesia. E de palavra em palavra, ele vai superando desafios e conquistando novos espaços. 
Confira a poesia que Osiel oferece a todos os professores:
Inesquecível
Talvez eu esqueça.
É... Talvez eu esqueça.
Talvez eu esqueça a maioria das lições
Que foram trabalhadas no quadro:
Geografia, história, ciências, matemática,
Os deveres de casa, as pesquisas...
Talvez eu esqueça o nome da
Maioria dos meus colegas de turma,
Talvez eu esqueça até o nome dos meus professores.
Sim, daqueles que passaram por mim e disseram um oi
E logo em seguida deram um tchau sem graça.
É... A memória dificilmente guarda aquilo que
Não tem uma carga de emoção.
Mas um mestre jamais passa por nossa vida
Sem deixar uma marca sulcada em nossa alma.
O mestre bole os nossos sentimentos,
Desperta sonhos,
Firma os nossos pés no chão,
Faz-nos ver além das montanhas
E alimenta esperanças.
Um mestre fala ao coração
E o que é dito ao coração jamais se perde.
As lições do mestre são lições para a vida.
São lições que não precisam ser anotadas,
Elas são diretamente gravadas na tábua do coração.
Outubro/2014
Osiel Basílio

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