“E sonhos não envelhecem”, assim diz Milton Nascimento em “Clube da Esquina II”.
A escolha dessa frase para iniciar o texto não é por acaso, ela diz muito sobre a
história da famosa ES-379, que interliga Castelo, Muniz Freire e Iúna.
Primeiro, a boa notícia do presente, o jornal A Gazeta, no dia 02 de maio noticiou o
lançamento do edital para asfaltamento do primeiro trecho, entre Castelo e Muniz
Freire. Ao que parece, finalmente, a obra esperada por décadas, vai sair do papel.
Quem tiver a oportunidade de trafegar por essa estrada asfaltada, será uma pessoa
mais do que privilegiada. Para explicar esse futuro privilégio, voltemos ao século
passado, mais especificamente para as décadas de 10 e 20, para entendermos, o
quanto essa obra será um marco na história do estado.
Agora estamos em 07 de abril de 1915, dia importantíssimo para a história de Muniz
Freire. De acordo com as mensagens de governo apresentadas pelo presidente do
estado ao Congresso Legislativo, o então presidente, Marcondes Alves de Souza (na
época Governador era chamado de Presidente) visitou Muniz Freire. Esse presidente
descreve a sua chegada à cidade assim: “A manifestação do povo por ocasião a
minha chegada a vila, foi uma verdadeira apoteose: todas as ruas e frentes de casa
estavam ricamente ornamentadas”. Depois, destaca a maior necessidade do
município: “Presentemente, a maior necessidade do município é a terminação de 12
kilometros que faltam para a conclusão da estrada para o Castelo, suspensa pelas
dificuldades financeiras emergentes”. O presidente então propõe uma parceria com o
município: “Não podendo actualmente o governo concluir a estrada, fiz um apelo ao
município afim de que ele tomasse o encargo da construção, dando o governo do
Estado um auxílio de dez contos de reis e as ferramentas que lhe pertenciam e que se
achavam em poder do Sr. Senna. Minha proposta foi aceita e espero que a referida
estrada fique concluída antes do término do meu governo”.
Pulando para 12 de outubro de 1916, vemos outro presidente, agora Bernardino de
Souza Monteiro, discorrendo sobre a importância da construção de estradas: “Merece
minha especial atenção, o problema de transporte no intuito de diminuir o custo da
produção”. Veja agora, qual era uma das prioridades do seu governo: “De uma rápida
inspecção na carta geral do Estado concluir-se-á que as primeiras estradas geraes a
serem construídas nas condições determinadas, serão as que liguem: a) O município
de Afonso Cláudio á E.F. Leopoldina; b) Rio Pardo (Iúna) á Villa do Alegre ou
Passados quatro anos, o relatório final do seu mandato em 23 de maio de 1920,
confirma que a obra não foi realizada de forma completa. Bernardino escreve sobre a
ES-379, mostrando que promessas não cumpridas é rotina desde o início do século
passado: “Rio Pardo se comunica com o exterior por Espírito Santo do Rio Pardo
(Muniz Freire) e Castello. Apesar dos grandes melhoramentos da estrada entre estas
duas últimas localidades, ainda são muito precárias as condições de transporte de
mercadorias entre Rio Pardo e Castello”. Depois, Bernardino diz por que é difícil
concluir a obra, uma das prioridades de seu governo, dividindo a culpa com a
natureza: “Será economicamente impossível realizar-se uma estrada carroçável,
substituindo a actual de cargueiros, tal as grandes diferenças de nível a vencer em
percursos relativamente curtos, em terrenos extraordinariamente acidentados”.
Mais quatro anos e a população de Muniz Freire nos anos 20 ganha mais melhorias
nessa estrada, mas não uma obra completa. É o que diz o relatório de governo de
outro presidente, Nestor Gomes, onde ele cita as obras feitas em todo o estado
durante o seu mandato. O relatório de 23 de maio de 1924 é revelador: “Construção
de uma Estrada de Automóveis (alguns trechos ainda carecem de retoques) ligando a
sede do município á Estação do Castello, com 17 kilometros de construção nova e 19
kilometros reconstruídos”. Esse trecho é interessante porque mostra um aspecto da
política brasileira que ainda se mantém que é o de contar obra pronta àquelas que
ainda não foram concluídas. Mais uma vez o sonho ficou pela metade.
Em 04 de maio de 1925, um novo presidente, agora Florentino Avidos, mostra em
suas mensagens de governo, vários projetos, entre eles “completar a estrada de Muniz
Freire a Castello”. No mapa das estradas capixabas, a descrição do estado da ES-
379, em 1925 não é muito diferente da condição da mesma nos dias de hoje: “Castello
á Muniz Freire em mau estado, precisa de reconstrução, alargamento e obras de
drenagem”. Quantas promessas, quantos reparos, mas nada de uma obra completa. E
segue o sonho.
No dia 15 de abril de 1926, um novo relatório de governo mostra o descaso que os
governantes tiveram com a estrada, vale especial atenção para esse relatório, pois se
vê que durante anos, o dinheiro foi mal gasto e o problema não foi resolvido: “Por ter
sido mal estudada, há necessidade de alteração do traçado e isso motivou demora na
execução dos indispensáveis reparos que se têm de fazer. É de imperiosa
necessidade e está sendo objeto de toda a atenção da Secretaria”. Mais promessas e
nada de se concretizar o sonho.
Temos a informação passada de forma oral por alguns muniz-freirenses, de que a
estrada foi aberta a mão, e não por máquinas. Na mensagem de governo, em 30 de
abril de 1927, Florentino Avidos fala das dificuldades econômicas do estado em
concluir a obra e apresenta como solução conceder a execução da obra ao
engenheiro Augusto Seabra, onde o mesmo contrataria capitães da própria região, e
depois teria o direito de explorar a estrada. O prazo de concessão a esse engenheiro
seria de 30 anos, além de o governo ter ditado a taxa a ser cobrada por transporte na
rodovia. A mensagem se encerra assim: “O concessionário tem o prazo de 27 meses
para abrir ao tráfego a estrada de Castello a Moniz Freire”. Não se sabe ao certo se
esse prazo foi cumprido, ou se a estrada foi construída com qualidade.
Segundo Agostino Lazzaro, em “Nella Terra Dei Padrone, Os italianos em Muniz
Freire”, a estrada foi “viabilizada somente a partir do final da década de 20 como
estrada de rodagem, seguindo praticamente a antiga trilha das tropas”. Outro escritor,
Carlos Brahim Bazzarella em “A História de Muniz Freire”, informa que a inauguração
oficial da estrada para tráfego de carros se deu em 1930. O mesmo autor traz a
informação de que em 1936, os ex-deputados, “filhos dessa terra”, Augusto Lins e
Attílio Vivacqua, apresentaram projetos na câmara para melhorias na estrada, e o
mesmo Attílio Vivacqua, já senador, no ano de 1957, apresentou emendas visando
investir na estrada, no que foi rejeitada pela câmara em 1958.
Depois de toda essa viagem no tempo, de tantos percalços, tantas dificuldades, de
sonhos realizados pela metade ou não realizados e de falsas promessas, voltemos
aos dias de hoje e a frase que inicia o texto, “E sonhos não envelhecem”. Está mais do
que claro que o sonho de Muniz Freire, de Castelo e também de Iúna não envelheceu,
eles se renovam a cada dia e agora que o governador deu um passo importante para
o início das obras, não custa lembrarmos os fracassos e decepções de mais de um
século. São mais de cem anos de espera, muitas gerações sonharam em ver essa
estrada com boa qualidade, e agora aqui estamos, novamente sonhando, mas pela
primeira vez, a certeza de que ele será realizado aparece nas palavras do governador
Renato Casagrande, a quem depositamos as nossas esperanças e os nossos sonhos
de ver essa obra concluída. Que o atual governador possa ao fim do seu mandato
escrever em sua mensagem de governo que concluiu o asfaltamento da ES-379. Faça
história governador, três cidades inteiras esperam e sonham por isso.
http://www.crl.edu/pt-br/brazil/provincial/esp%C3%ADrito_santo
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