Fundada em 1953 no município de Nova Venécia por apenas 17 produtores rurais, aCooperativa Veneza completou em abril de 2013 60 anos de história no setor lácteo. Criada com o intuito de resolver os problemas de comercialização de leite em uma região controlada pela pecuária de corte, a Veneza tornou-se a segunda maior Cooperativa de Laticínios do Estado do Espírito Santo. Após todos estes anos de atividade, com mais de 1200 fornecedores cadastrados, a cooperativa chegou à marca de 70 milhões de litros de leite captados no último ano.
Com o intuito de trazer um pouco mais de informações sobre esta cooperativa de sucesso, o MilkPoint fez uma breve entrevista com o Diretor da Veneza, José Carnieli.
MilkPoint: Como a Veneza se destacou nesse mercado?
Carnieli: A Veneza é uma Cooperativa singular que completou 60 anos no dia 30 de abril. Busca sempre manter um alto padrão profissional e tem como foco os queijos. Prima por qualidade e tem como estratégia competitiva os serviços, voltados essencialmente para venda horizontalizada, visando agregar maior valor aos seus produtos, atuando de forma independente e com mercado final definido.
MilkPoint: Quais são os projetos futuros da Veneza para manter o crescimento?
Carnieli: Hoje um dos maiores desafios é desenvolver a produção primária. No caso da Veneza, a sua bacia leiteira nada mais é do que o principal combustível que move a Cooperativa. Sem leite não existe Veneza e nenhuma outra do setor. Nesse sentido, a Veneza montou três Projetos que sustentam um quarto, todos voltados ao desenvolvimento da produtividade e melhoria da renda do Produtor Cooperado. Dois projetos – FAEVE I E II, consistem na compra e recria de bezerras leiteiras, fruto de inseminação artificial que serão revendidas com seis a sete meses de gestação para o mini e pequeno produtor, além do centro de treinamento que trabalhará toda mão de obra especializada para a atividade. O terceiro, a APLENC que é responsável pela compra e repasse de todo insumo básico na alimentação do gado de leite, visando otimizar custo, através da compra em conjunto, formando escala e rede de distribuição reduzindo frete, já que a região norte do Espírito Santo, não dispõe de oferta desses produtos indispensáveis à produção de leite. E, finalmente, o PROJETO LEITE CERTO, que é responsável pela assistência técnica continuada, trabalhando as questões do manejo, sanidade e gestão propriamente dita da propriedade. Incentivamos o empreendedorismo em detrimento do extrativismo. Sustentabilidade e melhoria da renda e qualidade de vida do produtor são objetivos permanentes.
MilkPoint: Quais são as iniciativas que a Veneza tem no campo para garantir o fornecimento?
Carnieli: Além dos projetos em curso, citados anteriormente, a Veneza tem todo um trabalho voltado para a produção de volumoso para o gado de leite, uma assistência veterinária preventiva e curativa, um informativo mensal que é a base de comunicação com o seu quadro social, além de outros serviços. No campo institucional, temos a continuidade dos objetivos sem o continuísmo das pessoas e alternância no mando, através dos órgãos colegiados da Cooperativa. Se não bastasse, temos uma tradição de mercado de captação e venda de produtos de 60 anos, além de um rigoroso programa de pontualidade e qualidade do leite.
MilkPoint: Se olharmos hoje para os maiores laticínios do mundo, temos muitos que são cooperativas, como a Fonterra, DFA, Friesland Campina e etc. Na sua opinião, porque no Brasil as cooperativas não têm a mesma força?
Carnieli: Penso que por razões meramente culturais. Segundo Carmem Bavoso, enquanto “os Estados Unidos têm uma tradição democrática herdada principalmente de seus pioneiros que, para sobreviverem, precisavam se fortalecer como grupos, e os japoneses têm uma tradição fidalga dos samurais, em que os valores eram fidelidade e honra, no Brasil, desde a colonização até o presente, o que se vê é o predomínio do autoritarismo e do paternalismo, em que uma minoria decide os destinos de todos. Dos donatários das capitanias à declaração de independência e ao império, o povo esteve ausente das decisões. A Proclamação da República mudou pouco esta situação. Neste um século de república, poucos foram os momentos em que vivenciamos autêntica democracia".
Nesta matriz cultural surgiram as Cooperativas Brasileiras que, salvo algumas poucas exceções - àquelas com uma supervisão direta, de Crédito e de Saúde - são um pouso de vaidade, protecionismo e amadorismo, situação impraticável num mercado competitivo e globalizado. Se não bastassem, fatores educacionais, tradicionais e de individualismo, têm corroborado com esse quadro de baixo desempenho das Cooperativas, sobretudo, do ramo pecuário, portanto, temos um discurso solidário e uma prática solitária.
MilkPoint: O que falta para que haja o fortalecimento /consolidação das cooperativas no mercado brasileiro? Quais são os maiores desafios?
Carnieli: Falta o despojamento das pessoas que estão à frente das Cooperativas. No Brasil, diretor de Cooperativa virou profissão com cargo vitalício além de casos de nepotismo e, consequentemente, temos baixo desempenho e uma visão sofrível de médio e longo prazo. Além do mais, no caso específico do leite, temos colocado no setor primário, todo mundo no mesmo barco e, com isso, talvez por um ranço e saudosismo do tabelamento de preço do passado, o produtor fica postulando pagamento da sua ineficiência, ancorado na falta de profissionalismo das Cooperativas.
Quanto aos desafios, temos os de ordem primária, organizacional e estrutural. Quanto ao produtor, falta profissionalismo o que gera baixa produtividade, fruto do baixo nível tecnológico, escala e qualidade. Em nível organizacional, temos Cooperativas que se tornaram meras “mercearias”, ou seja, se mantêm num “status quo” impregnadas pelo amadorismo, comodismo e conservadorismo, numa opção por morte lenta à mudança profunda. E finalmente, ao de ordem estrutural – estradas, energia, etc. Acredito que a porta de entrada do futuro é a educação. Infelizmente, o Cooperativismo brasileiro, só será fortalecido e consolidado com educação de qualidade e com valorização do produtor rural.
MilkPoint: Há alguma consideração a mais que o senhor considere relevante e que queira mencionar?
Carnieli: Acho importante ressaltar que o sistema cooperativista, não só o brasileiro, mas do mundo inteiro é o contraponto ao sistema capitalista. Segundo o nosso ex-ministro Roberto Rodrigues: “O cooperativismo, depois da queda do Muro de Berlim, é a Segunda Onda”. O sistema Cooperativista é o único que alinha o econômico com o social, porque valoriza as pessoas em detrimento do capital. O que precisamos no Brasil é de mais profissionalismo e comprometimento de todos, de uma maneira geral. Com empirismo, achismo e interesse próprio, não vamos chegar a lugar algum. Precisamos mudar a cultura e investir em educação, a partir daí podemos, por meio do Cooperativismo, transformar não só o Brasil, mas o mundo.
Esta matéria é do MilkPoint.
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