Neste mundão de meu Deus somos alguns bilhões, mas nenhum é igual ao outro. Nas idas e vindas que a vida da gente faz, encontramos com pessoas que nos agradam e certamente com muitas que não nos enchem os nossos olhos. Alguns parecidos, mas todos diferentes.
Destaco três pessoas que encontrei e que marcaram minha vida, me levando a fazer questionamentos lá do fundo da alma.
AUGUSTO RUSCHI, um italiano trentino com alma limítrofe na região fronteiriça com a Áustria, às vezes parecia uma alemão puro, frio e manso no primeiro contato.
Uma incógnita.
Na verdade uma figura amável, mas uma fera quando a questão era a Natureza.
Um homem decidido e determinado.
Uma alma latina com sangue quente e uma fé inigualável no que conhecia e no que realizava.
Homem da Ciência e da Floresta, que vivia em pleno amor com ambas.
Homem de gestos cadenciados e medidos, com olhos potentes enxergando além do horizonte geográfico.
Homem fora do nosso tempo.
Homem de garra e coragem que saiu da pequena Santa Teresa e projetou o meio ambiente de forma pioneira e corajosa.
No início foram as orquídeas, depois os beija-flores, tudo numa sequência lógica, como a sequência da vida.
Ainda hoje não conseguimos medir e avaliar a importância do trabalho de Ruschi em relação ao meio ambiente como um todo.
A sua produção passeia noas diversos campos da Ciência, trajeto feito com profundidade e coerência.
Quando voltou a sua terra pela última vez, o seu corpo foi morar definitivamente na floresta, mas a sua alma e a sua obra grandiosa permanecessem no coração e na consciência de muita gente.
Obrigado pelo rumo.
O médico JOÃO MADUREIRA, morava numa casa próxima a Praça Central de Cachoeiro de Itapemirim, tínhamos periodicamente encontros interessantes e produtivos.
Um médico diferente, daqueles que falam de tudo.
Íamos bater à sua porta para sorver dele a fina ironia e a experiência de décadas vividas na sua querida cidade, que o ancorava e lhe dava poder de estar morando na sede da capital secreta do Mundo.
Em volta de uma mesa cumprida muita gente batia ponto e saboreava as palavras sábias de João Madureira.
Uma platéia sempre firme e com plena consciência de que estava em território livre, num tempo de ditadura civil militar.
Falando das dificuldades do povo da cidade e da burrice predominante na elite, o velho Madureira costumava dizer que era mais fácil ser cachoeirense ausente do que presente.
João Madureira foi embora, deixando um grande vácuo.
Não partiu de Cachoeiro.
Tomou a condução em Marataízes, deixou vazia a alma de cada um dos seus frequezes do cafezinho. Hoje Madureira é nome da rodovia que liga Cachoeiro a Vargem Alta.
É também uma lembrança de uma voz envolta na fumaça do velho cigarro.
Ficou saudade de um tempo vivido e muito bem acompanhado.
A aula foi dada: presente meu Mestre.
PADRE HUMBERTO PIETROGRANDE, italiano miúdo e de conversa fácil, com as mãos contornando o ar, como construindo uma casa imaginária, de bases sólidas, paredes firmes e cômodos imensos, para abrigar a todos.
Por anos e anos percorreu o interior do Espírito Santo, fazendo discípulos, amigos e deixando fraternas lembranças.
Hoje continua firme lá no distante e sofrido Piauí, abrindo novas fronteiras/desafios e ganhando novos amigos.
Padre Humberto lançou a semente da Escola Família Agrícola.
Lançou a base do intercâmbio entre pessoas de realidades diferentes, com o espírito irmão e companheiro.
Hoje são 20 escolas no Espírito Santo e mais de 100 por este Brasil.
Preparou o terreno e nele lançou a semente.
Ajudou a cuidar das plantas que brotaram e dos seus frutos.
Continua lançando sementes.
Hoje milhares de pessoas saciam a fome na produção da primeira semente e outras tantas descansam à sobra da imensa árvore que um dia foi uma semente.
Da tua boca ouvi um dia, ao dirigir-se ao Governador Gerson Camata: conversa franca amizade longa.
A este jesuíta, imigrante por opção de vida: a benção meu Pastor.
Tive a felicidade de encontrar estes três homens no meu caminho.
A visão e a astúcia de AUGUSTO RUSCHI,
a ironia fina e a sagacidade de JOÃO MADUREIRA,
somadas a dialética e a fraternidade do Padre HUMBERTO PIETROGRANDE desembarcaram na estrada da minha vida.
A Gazeta 22 de julho de 1996
Nenhum comentário:
Postar um comentário