23/06/2014 -
Antonio Wady Jarjura é uma figura lendária no meio político colatinense. Um cidadão que acumulou nos seus 89 anos de vida (completados no dia 10 de junho) muito respeito e também muitas amizades. Foi vereador por vários mandatos, dos anos 60 aos 80, período em que também prestou muitos serviços ao município, atuando sempre no setor de obras da Prefeitura.
Jarjura faz parte da terceira geração da família que saiu do Líbano entre o fim do século XIX e o início do século XX. Grandes quantidades de libaneses de diferentes etnias e religiões saíram do país fugindo dos conflitos bélicos e perseguições religiosas.
O Líbano é um país do oeste asiático situado no extremo leste do mar Mediterrâneo, numa região onde surgiram as primeiras grandes civilizações. É uma das pátrias históricas dos fenícios, negociantes semitas da Antiguidade, cuja cultura marítima floresceu na região mais de 2000 anos e que criaram o primeiro alfabeto, do qual saíram todos os demais, tanto semíticos como indo-europeus.
O país foi colocado sob o comando francês confirmado pela Sociedade das Nações em 1922, após o fim da Primeira Guerra Mundial e outros acontecimentos, e a ocupação da Mesopotâmia e da Palestina pelas tropas francesas e britânicas. Reconhecida a importância que o petróleo teve durante a guerra, as potências ocupantes decidiram controlar seu território e impedir o acesso alemão aos poços de petróleo de Kirkuk. A República Libanesa foi criada em 1926.
Muitos libaneses migraram para a América nessa época, estabelecendo-se em países como os Estados Unidos, Argentina e Brasil. O avô de jarjura era um deles. “Eram três irmãos: meu avô Michel e mais dois. Ele preferiu vir para o Brasil, um foi para a Argentina e o outro para os Estados Unidos. Eles mantiveram contato por muito tempo. Sei que tenho muitos parentes nestes países, descendentes deles”, explicou.
Quando seus avós paternos, Michel Jorge Jarjura e Cecília, vieram para o Brasil, já eram casados no Líbano, e trouxeram de lá as filhas, Nazaré e Santinha. No Brasil, eles tiveram Wady Miguel, o pai deJarjura, que nasceu em Caravelas (Bahia). No Espírito Santo Michel foi capitão da Guarda da Polícia Militar (PM).
Wady Miguel casou-se com Amália Pratti e morava no município de Ibiraçu quando Jarjura nasceu em 1926. Cinco anos depois, ele fez o retorno de volta à terra natal da família, viajando com a mulher e o filho para conhecerem os parentes. E foi lá que Jarjura, filho único do casal, aprendeu a falar árabe, e também o francês, e viveu até aos 12 anos.
Jarjura conta que lá, na época, não existia escola, e por isso ele estudava debaixo de um pé de nozes, e para escrever usava a lousa. “Eu estudava sentado numa pedra e com a tábua na mão apoiada no colo. Era criança e tudo era divertido. No verão a gente subia para a montanha e no inverno descia. Lá eu era rico e podia fazer isso”.
Outras lembranças do Líbano, na memória dele, são a colheita de azeitona e as brincadeiras na neve, durante o inverno. “Nessa idade eu colhia azeitona. Uma colheita de 50 latas era transformada em muito azeite. Eu gostava demais. No inverno a gente brincava com neve, de jogar um no outro”, recorda.
Eram tempos de Charles de Gaulle, político e estadista francês, que inclusive virou amigo de Wady Miguel. “Eles eram muito amigos. Tanto que nós ficamos um mês na casa dele enquanto esperávamos o navio chegar no Líbano para voltarmos ao Brasil. Eu tinha 12 anos. Lembro que quando desembarcamos no Brasil, a 2 ...Guerra Mundial (1938 a 1945) estourou. Quase que ela nos pega em alto-mar”, contou.
Outro período marcante foi o período da Guerra. Foi quando o Líbano conquistou a independência (1943) e ocorreu outro fato inesquecível . Antonio relembra sorridente, que em 1945, entrou no exército e foi convocado para a Guerra, porém “quando ia embarcar para a Europa, ela acabou”.
Em Colatina
Em 1939 a família chegou à Colatina, para morar em São Silvano, que na época, segundo ele, “tinha só oito casas, Da cabeça da ponte Florentino Avidos até no trevo do Sesi/Senai eram 12 os donos das terras. Tudo de pequenas propriedades. Eram de Pedro Giurizatto, Orestes Bongiovani, Antonio Del Santo, João Monteiro Spelta, e as famílias Zaché, Ferrari, Sfalsini,Balrini Forrechi e Simonassi.
Das casas antigas, recorda, ainda existe uma que fica perto da casa do empresário Argemiro Balarini. Ela é feita de tijolinhos e muita gente que conhece morou lá. “O último foi o cabo Henrique. Nós moramos em frente dela. Ainda tem uma outra casa antiga , não dessa época, mas depois dela”, afirmou.
Jarjura falou também do Bar do Abdala, que ficava na esquina da Avenida Getúlio Vargas, próximo à Praça Municipal, perto da estação ferroviária quando ela era no centro da cidade e da antiga Casa Antenor. “O bar funcionava 24 horas. De dia era um bar comum e de noite abria para a farra. As mulheres da vida freqüentavam. No seu lugar hoje tem um prédio”, recorda.
No campo profissional, Jarjura trabalhou boa parte de sua vida como caminhoneiro, viajando pelas estradas do país. Da época, ele contou, que também guarda boas lembranças.
Do segundo casamento do pai, ele tem os irmãos Jorge e Cecília, criados por ele após a morte do pai, que morava em São Paulo, e faleceu aos 55 anos. A mãe morava no Rio de Janeiro, e dois anos antes de morrer (aos 99 anos) veio morar em Colatina.
Política
Jarjura ingressou na política por intermédio do engenheiro da Prefeitura, Belmiro Pimenta Teixeira. A ideia e o “empurrãozinho” surgiram depois de um encontro com o engenheiro em Ibiraçu, onde parou para jantar. Belmiro vinha de uma viagem a Linhares para Colatina, e ele deu-lhe uma carona no caminhão. Conversando na viagem, o incentivou a ser candidato.
“Eu estava com uma carga grande. Eu não o conhecia e aí conversamos, e ele disse que eu era muito simpático e popular. Ele era Moacyr Brottas, e eu Honório Fraga. O Edson Machado colocou o Zuza Zouain como vice do Moacyr Brottas . O Belmiro me lançou como candidato a vereador. E aí, fui o segundo mais votado, e depois repeti o mandato quatro vezes, de 1967 a 1982”, explicou.
O ex-vereador ressaltou que foi uma época que vereador não recebia salário: “Nenhum de nós ganhava um tostão para exercer o mandato. A gente trabalhava de graça para brigar pelas obras. No primeiro mandato nós éramos 17 vereadores, e deles só quatro estão vivos: eu, Nahum Soeiro, Paulo Stefenoni e Ailton Damásio”.
Prefeitura
Das administrações dos prefeitos José Zouain (Zuza) a Dilo Binda, ele trabalhou na Prefeitura como auxiliar de engenharia e também como secretário de Obras. Durante o período conquistou dezenas de amigos, entre eles, Belmiro e tenente José Veloso, que foi secretário de planejamento dos anos 70.
Inúmeras obras foram realizadas com sua direta participação como secretário de Obras. as obras. Entre elas, a implantação do Saae (Serviço Autônomo de Água e Esgoto), que hoje é o Sanear. “Antes do Saae, a água era da Prefeitura. Não tinha esse negócio de pagar água todo mês. Então, o Belmiro propôs a criação da autarquia, e o tenente José Veloso disse que Jarjura resolveria. Fizemos tudo, Moacyr Brottas assinou, e eu, como vereador, articulei e 12 vereadores votaram a favor. E aí colocamos Arminda Villaschi como diretora”, disse.
O ex-vereador afirmou que a terraplanagem da subida do então bairro Caixa D´água, hoje Aparecida, e o reservatório , no governo de Brottas, foram feitos quando estava na Prefeitura. Outra obra que citou, foi a preparação da área para a construção das 212 casas populares no bairro Honório Fraga, em terreno doado por Brottas. “Na época, o diretor da Coab (Cooperativa de Habitação), na época, era Tuffy Nader”.
Segundo ele, a fábrica de manilhas, que era em Maria Ismênia, e depois foi para Córrego das Pedras, também foi criada por sua determinação, além da canalização do Córrego São Silvano.
Na sua lista de diversas obras, ele relaciona ainda a construção de uma galeria entre o Hospital São José até ao Rio Doce, passando pela catedral e Hospital Sílvio Avidos. Na administração do prefeito Devacyr Zaché, uma galeria no Bairro Santa Cecília, a reforma da cadeia pública para abrigar o Batalhão da Polícia Militar (BPM), muro de arrimo no cemitério de São Vicente, calçamentos em ruas próximas do cemitério (São Vicente), calçamento em ruas do centro e bairro Sagrado Coração de Jesus, além de canaletas e pontes pelo interior do município.
De sua passagem pela Prefeitura, ele cita o então ministro dos Transportes Mário Andreazza, que conheceu em uma inauguração de uma rodovia no Recife. A amizade ficou tão forte e estreita que o ministro chegou a vir a Colatina receber o “Título de Cidadão Colatinense”, proposta pelo então vereador Jarjura. Na época, após conhecer a estrada de chão da Rodovia Colatina-João Neiva, Andreazza prometeu de asfaltar o trecho, e cumpriu a promessa meses depois,
Por ter muita facilidade de conquistar as pessoas com sua simpatia, Jarjura colecionou amizades, e múltiplas histórias. Uma que ele não esquece, segundo ele, é a que presenteou um general do exército, que havia estado em Colatina, com seis garrafas de cachaça, de boa qualidade, da região.
Contou ele, que já era vereador na época quando “telefonei de Colatina para ele dizendo que eu ia ao Rio de Janeiro falar com ele pessoalmente, e prometi levar uma cachaça da região para presenteá-lo. E aí entreguei a cachaça e ele então presenteou amigos com cinco e a única que ele ficou tinha água e não cachaça. Nós rimos muito disso, e eu então, mandei depois outras novamente”.
Foi dessa amizade, conforme disse, que teve a ideia de conseguir um terreno para a vinda de uma unidade do Exército em Colatina. Ele não conseguiu o terreno, mas a amizade ficou. “Tenho o reconhecimento do povo, que tem respeito por mim. Este é o meu maior legado. Perante ele eu sou reconhecido”, disse taxativo.
Muita festa
O ex-vereador é conhecido também por ser muito alegre e animado. Gostava muito de festa. O Carnaval era uma de suas alegrias: “Sempre gostei de carnaval. No governo de Paulo Stefenoni doei vários instrumentos para as escolas de samba. Nos anos 80 preparei várias escolas, já no governo Tadeu Giuberti. Fui presidente da Escola de Samba de Colatina Velha. Fui o maior sambista. Eu saía até no carnaval de Mogi das Cruzes (São Paulo)”.
No desfile do ano passado Jarjura emocionou a multidão que esteve presente na Avenida Beira Rio, como destaque da Escola de Samba Império de São Silvano, agremiação fundada por ele e os filhos Wady José e Wesley, nos anos 80. No futebol, torce para o Flamengo e Corinthians. É casado há 55 anos com Antonia (85 anos).
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