Eram 11:00hs. Eu preparava o almoço quando parou um táxi a minha porta. Nós morávamos no paiol. Era Gildo com uma criança no colo. Pediu para eu me arrumar para pegar o avião que sairia ao meio dia. Rapidamente atendi compreendendo a exiguidade do tempo. No caminho para o aeroporto Gildo mandou o taxista parar em frente a loja de calçados "A Principal", do Sr. Guilherme Guimarães. Ele desceu e voltou com um sapatinho de verniz branco. A criança de dois anos, abraçou o sapatinho e não mais o soltou. Somente quando o avião levantou voo fiquei sabendo do que se tratava. A garotinha, de nome Marlene, tinha câncer no olho. De aspecto repugnante, do tumor descia secreção o tempo todo. Gildo tinha providenciado alguns panos. Ele levou a viagem limpando o olho da criança e também limpando-a de uma diarreia incessante. Nem uma vez ele me pediu ajuda. Cuidou dela sozinho. A viagem era para Belo Horizonte onde um casal, membros de uma comunidade espírita nos esperava. Chegando nessa casa, ele pediu uma bacia e ele mesmo deu banho na garotinha. Deixou-a comigo e saiu, rapidamente, voltando cheio de roupinhas e mais panos. A noite comparecemos a um Centro espírita onde Gildo foi chamado pelo sobrenome, sem o conhecerem. Deram a ele instruções para levar a menina para o Rio de Janeiro e não se preocupar. Entidades espirituais iriam a frente e abririam as portas. Era Carnaval. Data menos indicada para tal mister. Descemos do avião no Rio e seguimos para o Instituto do Câncer. Reconhecemos a intervenção divina quando uma jovem simpática e sorridente veio ao nosso encontro e assim que nos vimos, nos reconhecemos. Ela era minha amiga do tempo de solteira. Havia se hospedado na casa de meus pais. Tudo deu certo. Criança acolhida, voltamos para Cachoeiro, pensando naquela menina que se afeiçoara ao "tio Gildo". Alguns meses depois voltamos ao Rio para visitá-la. Antes de entrar no hospital, lembrando que ela usava cabelo "Maria Chiquinha", Gildo comprou dez fitas de cabelo coloridas para presenteá-la. Chegou o momento tão esperado. E qual não foi o nosso constrangimento, tendo as fitas nas mãos e vendo a garotinha com a cabeça raspada. Ela abraçou com muita alegria aquele tio querido de quem não esquecera. Soubemos que ela dormia abraçada com o sapatinho de verniz branco. Ela era a mascote das enfermeiras. Elas a enchiam de mimos. Os médicos a operaram duas vezes.
Abraços fraternos,
Helena
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