terça-feira, 26 de maio de 2015

Tratamento de transtornos psíquicos vai além do uso de medicamentos


25/05/2015 - 09:35
 
Asscom/Sesa 
Sesa
Bispo Lessa aprendeu pintura em tela no CAPS Cidade e hoje compartilha o conhecimento com outros pacientes.
Estar em grupo, cantar, desenvolver trabalhos 
manuais, fazer passeios ao ar livre, visitar 
exposições de arte. Atividades como essas fazem 
parte de uma perspectiva humanizada de 
tratamento de pacientes com transtornos psíquicos. 
Dentro do Sistema Único de Saúde (SUS), os
 Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) são 
os principais fomentadores dessas práticas,
 que são fundamentais no processo de inclusão 
social dessas pessoas.

De acordo com a coordenadora do CAPS Cidade 
– vinculado à Secretaria de Estado da Saúde 
(Sesa) –, Ana Maria Domingues Carvalho, esses
 mecanismos terapêuticos possibilitam ao 
paciente descobrir novas potencialidades 
e possibilidades, reafirmam seu compromisso 
com suas atividades diárias e viabilizam o resgate de sua autoestima.

“O paciente se torna menos dependente da família e da equipe assistencial e passa a
 ter mais autonomia, tornando-se protagonista de sua trajetória. Essa condição gera
 um bem-estar que contribui para melhorar o convívio social, além de evitar e
 reduzir as internações por descompensação do quadro psiquiátrico”, detalha Ana Maria.

Elizabeth, Fátima, Lourdes e Bispo fazem parte do coral Cantando a Cidade, do
 CAPS Cidade, junto com outros pacientes e funcionários. Com o grupo, eles ensaiam 
toda semana e vira e mexe fazem apresentações. As últimas aconteceram na 
última semana. Foram quatro apresentações em espaços públicos da Grande Vitória
 em alusão ao Dia Nacional de Luta Antimanicomial, celebrado em 18 de maio.

“Pintura em tela, pintura em pano de prato, bordado... Aprendemos tudo aqui.
 Eu gosto das atividades do CAPS. A gente fica mais alegre, esquece as ideias 
negativas que passam pela cabeça”, diz Elizabeth Lacerda Ribeiro, 58 anos, que
 desde a infância passou por longos períodos de internação. Beth, que morava
 com a mãe, continuou na mesma casa depois que ela faleceu. É no mesmo 
quintal da família, mas ela mora sozinha, algo que representa bem sua independência.

Além de cantar no coral, Bispo Lessa da Silva, 58 anos, ensina pintura em
 tela para outros pacientes do CAPS Cidade. Apaixonado pelos pincéis, ele conta 
que trabalhava sem parar como pedreiro, cobrador de ônibus, fotógrafo e pintor 
de parede, antes de cair numa depressão severa causada por estresse há mais de
dez anos.

“Houve uma época em que eu não conseguia segurar um prato na mão de tanto 
que eu tremia. Tomava vários medicamentos. Às vezes ainda tenho a sensação
 de que estou sendo vigiado, mas já tomo menos remédios e estou de pé”, conta 
Bispo. Ele, que tem a voz tranquila e mantém o sorriso no rosto, sempre sonhou 
fazer pintura artística, e no CAPS pode colocar em prática o dom de pintar quadros, o 
que o deixa feliz.


Cura

De acordo com a coordenadora da Área Técnica de Saúde Mental, Álcool e outras
 Drogas da Secretaria de Estado da Saúde (Sesa), Maristela de Amorim Coelho, a 
Organização Mundial de Saúde (OMS) estima que 3% da população geral brasileira
 sofrem com transtornos mentais graves e persistentes, 6% apresentam transtornos
 psiquiátricos graves decorrentes do uso de álcool e outras drogas e 12% necessitam
 de algum atendimento, seja contínuo ou eventual.

Segundo ela, o índice de utilização dos serviços de saúde ainda é baixo no país, está 
em torno de 13%. Maristela Coelho diz que a maioria das pessoas que sofrem de
 algum transtorno mental não busca atendimento em saúde mental por diversos 
motivos, entre eles o estigma, o desconhecimento da doença, o preconceito e o medo.

Na avaliação dela, a própria pessoa, muitas vezes, negligencia seu quadro de saúde 
pelo fato de estar inserida em uma sociedade que julga e exclui quem está fora dos 
padrões ditos normais. “A pessoa com depressão, por exemplo, é julgada 
moralmente, é vista como preguiçosa, como alguém sem iniciativa. A falta de
 compreensão sobre as necessidades de saúde do outro atrapalham a busca 
e a continuidade do tratamento”, detalha Maristela Coelho.

Conforme explica a coordenadora do CAPS Cidade, Ana Maria Domingues Carvalho,
 falar em cura de transtornos psíquicos graves é uma questão polêmica porque, 
segundo ela, ainda não existe um indicativo de que isso seja possível. Mas ela 
ressalta que as doenças mentais podem ser tratadas e os pacientes podem sim ter 
qualidade de vida.



“A pessoa não precisa estar excluída porque é louca. O delírio, ou seja, aquilo
 que é muito particular do sujeito, portanto o distancia do social, mantém o paciente
 refém, uma vez que a troca com os pares fica comprometida. Quando se consegue 
fazer com que a loucura dele venha a público, ele tem a possibilidade de fazer o laço 
social. Num coral, por exemplo, ele passa a fazer parte de um grupo em que todos 
têm o mesmo objetivo. Dessa forma, o paciente passa a ter uma identificação com
 esse grupo porque o que ele sente e o que ele pensa é partilhado com o outro. O 
outro também pode testemunhar o que se passa com ele”, explica Ana Maria, 
que usa o termo loucura com muita tranquilidade.

Ela diz que a palavra loucura tem um peso muito negativo na sociedade e convida
 as pessoas a pensarem de forma diferente não apenas o termo, mas a condição 
da pessoa com transtorno psíquico. “Muitos de nós, que trabalhamos com saúde 
mental, usamos o termo loucura de forma poética e elogiosa. Afinal, 
tudo de novo e surpreendente que aconteceu na sociedade foi considerado primeiro 
loucura. Ser louco é não se enquadrar nas regras e, pelo menos do ponto de 
vista de saúde mental, isso não deve ser visto com olhar enviesado”, argumenta.

Autonomia

Morador de uma residência terapêutica, Jorge Eustáquio dos Santos, 51 anos, sai de
 casa sozinho e vai andar pela cidade. Sensação boa de liberdade que ele nunca sentiu 
durante os anos em que ficou internado. “Eu gosto de morar aqui. Lá não podia sair
 sozinho, só acompanhado”, conta.

Assim como outros pacientes que moram em residências terapêuticas, Jorge 
Eustáquio faz acompanhamento num Centro de Atenção Psicossocial. A coordenadora do 
CAPS Moxuara, Maria das Graças Moutinho Trancoso, conta que ele gosta de participar do
 Grupo Tramas, uma oficina terapêutica que confecciona tapeçaria. “As peças produzidas
 pelos pacientes são vendidas e a renda é entregue a eles”, diz a coordenadora.

Sair sozinho, ter o seu próprio dinheiro e poder comprar o que ele quiser. A psicóloga 
Gabriela Bertulozo Ferreira, do CAPS Moxuara, diz que a individualidade é um fator 
extremamente importante para o bem-estar do paciente. “A identidade do 
paciente fica comprometida em casos de internação prolongada. Ele vê todos os 
dias as mesmas paredes, as mesmas pessoas. Ele não tem objetos pessoais. 
Tudo é de todo mundo. Por isso é tão difícil retomar a vida para alguns pacientes
 transferidos da internação para as residências terapêuticas”, detalha a psicóloga,
 que ressalta a importância do resgate da autonomia e do fortalecimento dos vínculos
 familiares e comunitários.


Na avaliação de Gabriela Bertulozo, cada caso deve ser tratado conforme suas 
particularidades. Ela diz que o paciente não deve ser forçado a fazer uma oficina 
de pintura, por exemplo, se ele não gosta. É preciso encontrar algo que o agrade.
 Ela conta que, de forma geral, observa uma melhora da autoestima e do 
bem-estar dos pacientes.

“Em casos mais crônicos, não podemos pensar em grandes avanços, pelo menos
 inicialmente. Alguns pacientes nem falam, mas numa oficina de dança, por exemplo,
 expressam um sorriso. Via de regra, se o paciente gosta de determinada atividade, 
a oficina vai ajudá-lo. É um momento em que a pessoa se ocupa e se sente valorizada
 porque, ao final, ela vê o resultado de algo que ela produziu. Muitos pacientes dizem 
“eu não sei”, “eu não consigo”, e aos poucos vamos trabalhando esses sentimentos 
com eles. Quem sabe despertar neles a vontade de voltar a estudar, de voltar a
trabalhar. Podemos criar possibilidades, crias novas formas de viver e de estar
 no mundo", conclui.
Informações à Imprensa:
Assessoria de Comunicação da Secretaria de Estado da Saúde
Jucilene Borges
jucileneborges@saude.es.gov.br / asscom@saude.es.gov.br
Juliana Rodrigues
julianarodrigues@saude.es.gov.br
Ana Carolina Stutz
anapinto@saude.es.gov.br
Juliana Machado
julianamachado@saude.es.gov.br
Texto: Juliana Rodrigues
Tels.: (27) 3345-8074/3345-8137/9 9969-8271/9 9983-3246/9 9943-2776

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