Éramos noivos quando Gildo me presenteou com um acordeon, em alta na época. Eu já estudava piano com Dona Betinha Monteiro e passei a estudar o novo instrumento. Entusiasmado com meu progresso, Gildo me levou para tocar para dois irmãos, já rapazinhos. Eles eram deficientes físicos e mentais que moravam em uma casinha construida em um terreno vizinho a Santa Casa. Não sei se foi Gildo ou alguma instituição espírita que construiu mas sei que Gildo os mantinha. Havia uma senhora contratada para cuidar deles. Apesar da deficiência eram inteligentes e muito alegres. Nosso convívio passou a ser diário depois que nos casamos pela proximidade de nossas casas. Eles adoravam musica e quando chegávamos era uma festa. Os garotos não falavam, não andavam, mas pulavam de alegria em suas camas e gritavam para demonstrar suas alegrias. Eu também tocava para a criançada que adorava - filhos, sobrinhos, vizinhos. Meu repertório era o mínimo necessário para entreter a meninada. Quando meu cunhado Gilceu Machado faleceu, coube a mim distrair as crianças. Elas não sabiam do falecimento do pai e tio. As músicas que eu tocava, eram alegres e saltitantes. Eu tocava e a meninada dançava e pulava. De repente chegou, muito contrariada, a minha sogra. Ela tinha razão. O momento não era apropriado para tanta alegria. O corpo nem baixou à sepultura, dizia ela: - o que vão pensar os vizinhos? Que estamos em festa? E, constrangida, fechei o instrumento e fui contar estórias. Por que não pensei nisso antes?
Muitos perguntam que fim levou meu acordeon. Quando desmanchei a casa para construir outra, Gildo levou o acordeon para a Fazenda. Ele teve um triste fim, soube depois. Pouparam-me o desgosto de vê-lo comido por cupins.
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